Num mundo onde o fundamentalismo de carácter religioso vai somando pontos – materializado na terrível luta pela liberdade de expressão, pela qual pessoas são mortas, condenadas ou apenas proscritas em nome duma fé que em muito ultrapassou os limites da dignidade humana –, há um livro que, apesar da comicidade que encerra, nos fala desses tempos, não tão longínquos, onde a vida – apesar de ser entendida na sua transitoriedade entre o Céu e o inferno – era uma simples mercadoria à mercê de um poder feudal e de um entendimento criacionista engenhosamente construído pelo género masculino contra o símbolo terreno da mácula e da desvirtude representado pelo todo feminino.
Falo do romance «O remorso de Baltazar Serapião», de valter hugo mãe (QuidNovi, 2006). A obra é uma ode medieval ao conceito de amor, na qual a mulher nada mais seria que o receptáculo do vigor e das frustrações do homem, subjugada aos mandos e desmandos dos zelosos maridos, equiparada, numa escala hierárquica informalmente aceite, aos animais de criação que à pobre casa traziam sustento.
Este livro é uma espirituosa metáfora à exploração humana que facilmente pode ser transposta para o mundo contemporâneo através de um simples exercício de substituição do cenário e dos actores, uma vez que o uso (e abuso) do poder continua a manifestar-se com a mesma virulência e o mesmo grau de impudor.
O estilo da prosa, que recorre ao arcaísmo medieval, é um regalo que por si só confere à obra e à sua leitura o efeito burlesco que, por certo, o autor lhe pretendeu dar.
É um romance satírico, gracioso e viciante – lê-se de uma só penada –, que me ficou na memória pela representação imaginosa, porém com fortes marcas de verosimilhança, desta comédia que é a vida.
Falo do romance «O remorso de Baltazar Serapião», de valter hugo mãe (QuidNovi, 2006). A obra é uma ode medieval ao conceito de amor, na qual a mulher nada mais seria que o receptáculo do vigor e das frustrações do homem, subjugada aos mandos e desmandos dos zelosos maridos, equiparada, numa escala hierárquica informalmente aceite, aos animais de criação que à pobre casa traziam sustento.
Este livro é uma espirituosa metáfora à exploração humana que facilmente pode ser transposta para o mundo contemporâneo através de um simples exercício de substituição do cenário e dos actores, uma vez que o uso (e abuso) do poder continua a manifestar-se com a mesma virulência e o mesmo grau de impudor.
O estilo da prosa, que recorre ao arcaísmo medieval, é um regalo que por si só confere à obra e à sua leitura o efeito burlesco que, por certo, o autor lhe pretendeu dar.
É um romance satírico, gracioso e viciante – lê-se de uma só penada –, que me ficou na memória pela representação imaginosa, porém com fortes marcas de verosimilhança, desta comédia que é a vida.
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