terça-feira, 29 de novembro de 2011

Memória


Nada de resenhas, críticas, ou pseudo-recensões – ainda me vergastam pela foice cravada na seara dourada deles. Trata-se apenas da exteriorização de um desassossego. Perdão! Fui assombrado pelo quarteto de palavras que formam a frase que encerra a centena e meia de páginas deste aqui ao lado – o Booker Prize deste ano. Talvez aquele que nos últimos dois ou três anos mais fez vibrar a corda sensível da minha condição de leitor ávido: «Há uma grande agitação.» [There is great unrest] – unrest.
     
Acumulação.
Seguimos com as nossas vida sem perceber… nunca percebemos. Caminhos trilhados a remover obstáculos que se vão acumulando, formando muros insuperáveis para quem outrora nos rodeou e seguia os nossos passos; e quando olhamos para trás apenas vislumbramos vultos difusos, uma memória esparsa que se foi enterrando nos escombros do quotidiano pelo egoísmo intrínseco à nossa subsistência.      
Responsabilidade.
A tomada de consciência. O despertar da memória – puxar os fios soltos que adejam ao vento, radicados ao solo estéril, que a libertam do entulho opaco, infecto e nauseabundo –, a miséria humana. A culpa pela dor atroz infligida.  
Agitação.
Não há reparação, nem nunca iremos perceber que todos os actos praticados com esse fim apenas irão servir para ampliar o sofrimento provocado. Resta o remorso:
«Às vezes penso que a finalidade da vida é reconciliar-nos com a sua eventual perda esgotando-nos, e provando, por muito tempo que leve, que a vida não é tão boa como se diz.»

Julian Barnes, O Sentido do Fim, pág. 109

[Lisboa: Quetzal, Novembro de 2011, 152 pp.; tradução de Helena Cardoso.]

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

manuel a. domingos

Teorias
tiragem única de 100 exemplares
composição, paginação e ilustração de Sérgio Nogueira
Edição de Autor
2011



domingo, 13 de novembro de 2011

Uma punch line do atordoante Smog


«Estourei os micrómetros com os primeiros golpes que dei no saco de areia. Prendi-os com uma ligadura à volta das mãos antes de calçar as luvas e arremeti contra o saco até os dedos ficarem ensanguentados, desfeitos e em carne viva.
»O meu treinador está muito, muito impressionado. Quero dizer, não parece de todo impressionado. Cheguei a convencer-me de que descobriria o meu potencial. A semente. Da grandeza. Nem pensar.»
Bill Callahan, Letters to Emma Bowlcut (Chicago: Drag City, 2010) [excerto da “Carta 59”; tradução livre: AMC]

Persisti em esmurrar-vos nos gumes escabrosos da realidade; expostos, despidos no púlpito do desespero. Degradante exibicionismo. Sois miseráveis, afastados da ribalta pelos aduladores da podridão. Jamais saltareis para o ringue. Vós? Nunca… Nós? Em tempo algum. Até ao dia. Rebentarei. Eu.


Bill Callahan, “Riding for the Feeling”, Apocalypse (Drag City, 2011)

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Às distribuidoras de filmes

Vão-se foder!


Enfiem-nos pelo vosso respectivo centralista.
Façam lá os vossos festivais. Convidem 2347 personalidades pagas a peso de ouro com financiamento provindo do Orçamento de Estado, que é alimentado alarvemente pelos nossos impostos, inter alia, nortenhos, algarvios, transmontanos, beirões, e conspurquem-se em belugas mal-cheirosas, divirtam-se com as bolhinhas carbónicas dos Moët & Chandon, Bollinger e Veuve Clicquot, ou então, com shots inebriantes de Stolichnaya e de Ketel One, a que, decerto, não faltarão umas linhas alvo-pulverulentas nos autoclismos dos concorridos toillettes.


Bom proveito, que por aqui ainda vai existindo a Internet.