Na margem esquerda de um rio, por entre a neblina expelida por aquela linha de água cálida e a reverberação, numa paz sibilante, do coaxar das rãs, um solitário escorpião vislumbra, na outra margem, a terra prometida de escorpionas em topless exibindo ostensivamente as suas rabichas peçonhentas.
O macho, que nunca foi de nadar, procura, num frenesim de testosterona em ponto de ebulição, algo ou alguém que o carregue para aquela margem idílica, a direita.
Num nenúfar, não muito longe da margem, avista uma pequena rã palpitante, de porte atlético, que de olhos bem abertos ignora o efeito danoso dos ultravioleta nas suas anfíbias retinas.
O sagaz aracnídeo, numa punção ejaculatória, arquitecta um plano para transpor de forma rápida e incólume aquele purgatório de águas lodosas:
– Minha linda flor verde de coxas deleitosas e muito apreciadas! – começou o finório. – Preciso de chegar à outra banda antes que anoiteça! – disse-o, amaciando a voz. – Será que abusarei da tua confiança se me carregares nas tuas resplandecentes e firmes costas?
A pequena rã, bondosa na sua essência, reforçada durante tempos infindos por um lar repleto de urbanidade ainda se conhecia como um imberbe girino, depressa anuiu, não sem que antes avisasse o potencial ser deletério para os perigos em que o seu canastro incorria pelo ousado transporte.
O lacrau, na sua voz melíflua, logo lhe assegurou que riscos corriam-se nos casinos ou na bolsa e que entre irmãos – nessa imensa fraternidade que os unia contra o Homem ignóbil e poluidor – jamais poderia existir a desconfiança e até mesmo o vil sentimento de traição.
Assim posta a coisa, o pobre batráquio inicia a sua viagem com a besta encavalitada no seu dorso, apelando a todos os anjos e santos que lhe concedam o dom de resistir a tão rígido esforço, quase desbatraquiano.
A meio do percurso, num estertor de guelras e bofes, a pequena rã sente uma dor atroz no fundo da espinha que lhe percorre, numa fúria incontida, todo o corpinho esponjoso num décimo de segundo. Numa vozinha membranosa, diz:
– Então, o que se passa!? Carrego-te… blurp… blurp… às co… co… costas… aaarf… e fa… fa… fazes-me… blurp… u… umm …uma me… merda destas!?
O escorpião, de aguilhão crivado no mais fundo daquele ser, riposta num tom escarninho e, simultaneamente, triunfante:
– Pois é, meu caro amigo! Está na minha natureza!
Pequena história adaptada por mim de um excerto do argumento de «The Crying Game», de Neil Jordan.
O macho, que nunca foi de nadar, procura, num frenesim de testosterona em ponto de ebulição, algo ou alguém que o carregue para aquela margem idílica, a direita.
Num nenúfar, não muito longe da margem, avista uma pequena rã palpitante, de porte atlético, que de olhos bem abertos ignora o efeito danoso dos ultravioleta nas suas anfíbias retinas.
O sagaz aracnídeo, numa punção ejaculatória, arquitecta um plano para transpor de forma rápida e incólume aquele purgatório de águas lodosas:
– Minha linda flor verde de coxas deleitosas e muito apreciadas! – começou o finório. – Preciso de chegar à outra banda antes que anoiteça! – disse-o, amaciando a voz. – Será que abusarei da tua confiança se me carregares nas tuas resplandecentes e firmes costas?
A pequena rã, bondosa na sua essência, reforçada durante tempos infindos por um lar repleto de urbanidade ainda se conhecia como um imberbe girino, depressa anuiu, não sem que antes avisasse o potencial ser deletério para os perigos em que o seu canastro incorria pelo ousado transporte.
O lacrau, na sua voz melíflua, logo lhe assegurou que riscos corriam-se nos casinos ou na bolsa e que entre irmãos – nessa imensa fraternidade que os unia contra o Homem ignóbil e poluidor – jamais poderia existir a desconfiança e até mesmo o vil sentimento de traição.
Assim posta a coisa, o pobre batráquio inicia a sua viagem com a besta encavalitada no seu dorso, apelando a todos os anjos e santos que lhe concedam o dom de resistir a tão rígido esforço, quase desbatraquiano.
A meio do percurso, num estertor de guelras e bofes, a pequena rã sente uma dor atroz no fundo da espinha que lhe percorre, numa fúria incontida, todo o corpinho esponjoso num décimo de segundo. Numa vozinha membranosa, diz:
– Então, o que se passa!? Carrego-te… blurp… blurp… às co… co… costas… aaarf… e fa… fa… fazes-me… blurp… u… umm …uma me… merda destas!?
O escorpião, de aguilhão crivado no mais fundo daquele ser, riposta num tom escarninho e, simultaneamente, triunfante:
– Pois é, meu caro amigo! Está na minha natureza!
Pequena história adaptada por mim de um excerto do argumento de «The Crying Game», de Neil Jordan.
1 comentário:
muito bom.
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