sábado, 4 de outubro de 2008

Insulares, ignorantes e provincianos

DeLillo, McCarthy, Pynchon, Roth e Updike
Estes acima bem podem esperar. Horace Engdahl já os sentenciou ao olvido da Academia Sueca, por muitos livros que vendam, por muitos encómios que lhes dirija a crítica literária, por muito estudados que sejam nos bancos da universidade, nos cursos de filologia e nas inúmeras teses sobre a literatura americana.
É apenas o Nobel, o prémio máximo da literatura mundial que condecora a carreira de um escritor, que lhe dedicou, de corpo e alma, uma vida... mas não é o fim do mundo.
Aquele quinteto nascido na década de 30 do século passado, por azar Nobel criado em terras do Tio Sam, não necessita desse género de honrarias snobes de uma chusma de pedantes suecos colocados na sua torre de marfim, onde mora uma sala bafienta e anquilosada da elite nórdica das letras.
O quinteto é realmente apreciado por leitores e literatos de todo o mundo, mesmo por aqueles que tolamente costumam desdenhar de tudo o que seja americano, esquecendo-se que as suas vidinhas enfadonhas são quotidianamente assaltadas por algo que está directamente relacionado com a maior democracia do mundo.
Uma democracia com defeitos, pois claro. Apontados com toda a legitimidade e em primeiro lugar pelos seus filhos. Leiam-se as obras mais representativas do quinteto. São os primeiros a apontar o dedo aos exageros e aos contrastes da sociedade americana, à politica governamental tanto interna como externa. Todavia, une-os um sentimento de pertença a um todo heterogéneo que acolheu uma série de raças, crenças e ideologias, e é isto que alguns europeus não perdoam, perdidos nas mesquinhas rivalidades ancestrais entre povos no mesmo território.
O grande inimigo é a maior democracia do mundo. O desnazificador da Europa, o escudo contra o retrocesso primitivista da barbárie comunista da União Soviética. O governo que Pinter acusou de genocídio e de gerador de todos os males do mundo, o país que Dario Fo chamou de império do mal, a nação que Lessing chamou de histérica pela recordação comovida dos milhares de civis inocentes mortos no 11 de Setembro… e Grass e Saramago e Gordimer
Os esquerdistas europeus não gostam de Roth, desconhecendo a sua militância esquerdista – o que pensarão de DeLillo ou do mais radical Gore Vidal?
É verdade, não suporto aqueles intelectuais da treta que ostentam ou ostentaram a foice e o martelo, pertencem ou pertenceram a partidos que os exibem ou exibiam com um orgulho impune. O símbolo sob o qual se mataram inocentes pelos ideólogos Lenine e Trotsky entre 1917 e 1924, o Terror Vermelho, a Tchéka, o KGB, os gulags, Estaline, Pol Pot, Mao Tsé-Tung, Ceausescu, e que continua a figurar sem condenação nas bandeiras de alguns sectários que se alimentam das democracias ocidentais. A “suástica metamorfoseada, vermelha e dourada” que legitimamente continua entrar-nos pela casa dentro com uma indiferença amnésica da barbárie comunista.
Mas somos avessos a insulares e a provincianos. Exprobramos os ignorantes da iridescência cultural que pinta o mundo – mas não queremos misturas, nem multiculturalismo, nem liberdade religiosa, nem véus, nem memórias coloniais, nem capitalismo e nem tão-pouco um mercado livre e despojado de paternalismos vomitados por uma elite intelectual.

A seguir, ou seja, quando houver tempo, um pouco de Jean-François Revel.

2 comentários:

J. Maldonado disse...

De facto este incidente apanhou-me de surpresa, tendo reforçado a ideia segundo a qual o Nobel da Literatura é mais um prémio político que cultural. Por isso mesmo admiro bastante Sartre por tê-lo recusado...
A maior parte da elite cultural europeia está alienada da realidade actual, vivendo num rive-gauchisme anacrónico.
Acredito que o actual anti-americanismo na Europa não seja sincero, pois, no fundo, é um eurocentrismo não assumido ("no armário"). A Europa diante dos E.U.A. revela a típica atitude altiva dum aristocrata arruinado perante um novo-rico em ascensão...
Como em todos os países, nos E.U.A. há bons e maus autores, por isso a aitude preconceituosa desse membro da Academia Sueca é um reflexo do eurocentrismo cultural e político... Há muito que o mundo deixou de gravitar em torno da Europa...

André Moura e Cunha disse...

100% de acordo.