
Lino foi um inspirador para os filólogos no enriquecimento da língua, graças às suas desembestadas profissões de fé que o próprio, de imediato, tentava colocar em prática no seu estilo picaresco, à verbosidade e à assincronia profunda entre pensamentos, palavras – que oprimiam os primeiros até ao grau mínimo –, e acções – felizmente, travadas a tempo, pelo próprio quando chamado à razão mínima, ou por interferência de outros contando-lhe uma anedota derrogatória. Com ele ganhou o português, não o cidadão, desiludam-se, mas a língua falada por centenas de milhões de pessoas espalhadas pelo mundo ao introduzir-se o nome “linismo” e todos a morfologia conexa.
Aliás, a acção concertada entre o referido ministro e o seu companheiro de Governo com a pasta da Economia criou o famoso mutante, de proporções quase bíblicas – acredita-se mesmo que o esqueleto de Mary Shelley finalmente se pulverizou na tumba, tantas foram a contorções orbiculares de inveja pela pequenez espiritual do seu Frankenstein –, mais conhecido por Pinholino, cujos efeitos em forma de mito sobre a população são, por ora, desconhecidos: Irá ser um monstro bonacheirão, a quem se alude para uma boa piada social? Ou um terrível e assustador mostrengo que assombrará as mentes mais vulneráveis, especialmente as de crianças de tenra idade, a razão de ser das noites negras e tempestuosas a cada passo rasgadas por um clarão fantasmagórico, seguido de um trovão arrasador?
Não sabemos. O tempo encarregar-se-á de o demonstrar.
“Come a sopa toda senão eu chamo o Pinholino.” “Não entres tão depressa nessa noite escura (versão de omnipresença megalómana ou de ALA) que o Pinholino vai-te papar.” “Fumar pinholiniza.” “30 condutores detidos numa operação stop realizada sexta-feira passada na A-28, conduziam sob vestígios do efeito de pinholinol.” E por aí fora.
Mas o que me trouxe a estas linhas – não férreas, porque dessas o Lino encarregou-se, com um afinco inusitado, de as desalinhar de vez, neste pobre pais centralista – foi o esmiuçamento de sexta-feira passada sobre – e porque não, como fazem os Gato a si mesmos, epitetar o ministro, ainda que, a adjectivar, jamé com variações vocabulares de engrandecimento, senão com um qualificativo que revele uma certa irreflexão comportamental – o truão acidental Lino. A dada altura, RAP confronta-o com os mimos que António Costa deu de regalo ao desafortunado ministro, quando aquele passou a gerir os destinos do município lisboeta. Numa alegoria, talvez pinholínica, de “panos e nódoas”, Lino diz:
«Aliás, foi um grande político contemporâneo português, o engenheiro José Sócrates que… e parafraseando uma frase dele, que está para nascer o Ministro das Obras Públicas que tenha feito mais pelo concelho de Lisboa do que eu – quem diz por Lisboa, posso dizer o mesmo pelo Porto e pelos muitos outros no país…»
Claro, claro, eu bem sei o que fizeste pelo resto do país, vivendo eu na sub-região à volta do umbigo alfacinha.
Vai daí e desfia, sem qualquer tipo de pudor, o rosário das benesses centralistas:
«(…)acabámos a CRIL, o eixo Norte/Sul, o túnel do Rossio, o túnel do Mmm… [aqui ia-se apropriando de obra alheia] do Terreiro do Paço, o Cais das Colunas, o Metro entre o Chiado e Santa Apolónia, passámos para a gestão da Câmara Municipal as áreas das zonas portuárias que não tinha utilização portuária… enfim, milhentas coisas que foram feitas.»
Quantos milhões dos nossos impostos, de A Região e da sub-região? Dá vontade de procurar os custos com derrapagens abissais perante o orçamentado, fazer a soma e mostrar em letra gorda ao país todo. E ainda falta somar o que aí vem: a 3.ª travessia sobre o Tejo; o TGV Lisboa/Madrid para meia dúzia de felizardos que se podem dar ao luxo de perder um dia de viagem para a Capital espanhola e pagar um quantia avultada de bilhete, enquanto se vão multiplicando as companhias de aviação low-cost; o aeroporto de Alcochete; e não sei quantas mais linhas de metro.
E termina (como começou) com um auto-elogio, embora o primeiro tenha pretendido ser uma ironia:
«Fui um grande… e, enfim, esmerei-me e… e dei tudo o que pude para contribuir para a sua vitória – foi muito boa – acho que Lisboa tem hoje um grande Presidente da Câmara, e estou convicto que ele vai ser… vai fazer um excelente mandato durante os próximos quatro anos.»
Pobre Elisa. Pobre Apolinário. E todos os outros candidatos a autarca do partido da rosa.
Nota: entre aspas francesas figura a transcrição textual (melhor, de ouvido) de parte da entrevista dada por Mário Lino a Ricardo Araújo Pereira no passado dia 16, no programa Gato Fedorento Esmiúça os Sufrágios, da SIC. Por qualquer erro sintáctico ou gramatical, o Ministério das Obras Públicas pede perdão, compensando com a construção de uma rotunda em sítio a combinar.