«A pena é uma emoção tão horrível e tão inútil – temos de reprimi-la e guardá-la para nós mesmos. Quando tentamos exprimi-la, só pioramos as coisas.»
Paul Auster, Invisível, p. 97.
[Alfragide: Asa, 1.ª edição, Outubro de 2009, 236 pp; tradução de José Vieira de Lima; obra original: Invisible, 2009.]
Aproxima-se o dia que cobriu de dor aqueles que mais quero, e quis a sorte que se colasse à data em que os católicos no seu masoquismo perene correm em bando, de cabeça baixa, pela alvenaria dos trilhos cortados entre campas, para recordar aqueles que, por maiores que sejam a recordações de felicidade e de profundo afecto, deixaram a dor de uma perda irreparável e os terríveis “ses” que se entalam na garganta e sufocam um grito, porventura, se exteriorizado, pouco abonatório da urbanidade das nossas vidas civilizadas.
Amanhã será o dia de tréguas. A suspensão de uma provável recidiva da discussão teológica familiar entre o que acredita que o fim é um valor absoluto, de saudade e dor – o já descrente que deixou, em definitivo, de acreditar –, e aquele cuja fé se reforçou porque não acredita num Deus cruel e injusto, num Decisor impiedoso que arrebatou para si alguém na flor da idade, que só o fez para acomodar a sua alma desamparada numa vida melhor.
Amanhã, serão sete os anos de ausência que ainda não consigo conceber como caridosa.
Não é pena, nem tão-pouco uma súplica por piedade. É uma revolta pela incompreensão de tão bárbaro destino para os que cá ficaram.