domingo, 15 de fevereiro de 2009

Eastwood

Clint Eastwood em Caçador Branco, Coração Negro
Os Jogos Florais

Do inquérito, que durante uma semana figurou na coluna da esquerda deste blogue, resultou uma clara repartição de preferências por dois realizadores contemporâneos, ainda vivos, que têm enchido de fascínio e sedução o grande ecrã de muitas salas de cinema espalhadas pelo mundo.
Perguntou-se que realizador de cinema, vencedor nos últimos vintes anos (1988-2007) do Óscar da Academia na categoria “Melhor Realizador”, elegeria como o preferido.
Um apelo irrestrito à subjectividade de cada uma das (poucas) pessoas que visitam este blogue. Sem juízos de valor, sem demais comentários.
Entre as 61.ª e 80.ª cerimónias de entrega dos Óscares da Academia das Artes e das Ciências Cinematográficas de Hollywood, que decorreram entre os anos 1989 e 2008, respectivamente, entre Barry Levinson (Encontro de Irmãos; Rain Man, 1988) e Joel e Ethan Coen (Este País Não É para Velhos; No Country for Old Men, 2007), dezoito nomes venceram o prestigiado galardão (dezanove se desdobrássemos a irmandade Coen em Joel e Ethan). 20 anos, 18 realizadores, uma vez que Clint Eastwood venceu o Óscar para “Melhor Realizador” por duas vezes: em 1993 por Imperdoável (Unforgiven, 1992) e em 2005 por Sonhos Vencidos (Million Dollar Baby, 2004); tal como Steven Spielberg: em 1994 por A Lista de Schindler (Schindler’s List, 1993) e em 1999 por O Regaste do Soldado Ryan (Saving Private Ryan, 1998);

A votação

Ao contrário do relativo sucesso do desafio anterior (atendendo à dimensão deste blogue oculto nas brumas da blogosfera), apenas votaram 39 visitantes, votação que resultou nos seguintes dados estatísticos:

  • 11 dos 18 realizadores não obtiveram um único voto (neste grupo estavam incluídos realizadores como Spielberg, Polanski ou Soderbergh);
  • Dos 7 nomes que obtiveram votos, 4 obtiveram apenas 1 voto (Ang Lee, irmãos Coen, Jonathan Demme e Ron Howard) e somente 1 obteve 2 votos (Sam Mendes);
  • Dois realizadores foram responsáveis por 83% dos votos: Clint Eastwood liderou, com algumas intermitências, e obteve 19 dos 39 votos, contra 14 votos em Martin Scorsese.

Talvez tenha vencido a arte em todo o seu fulgor espectral e iridescente, contra a arte do pormenor, quase científica, do detalhe técnico e de movimento. Um atrevimento ou diatribe cinematográfica de minha autoria, na incomparabilidade de ambos os colossos: Ford venceu Hitchcock.

A minha preferência

Prefiro Scorsese a Eastwood, mas sempre gostei mais dos filmes de Clint do que os de Martin. Esclarecidos. Naquela frase tentei expressar, com o máximo de cuidado e rigor, o absurdo de tal escolha.
Se, como no filme de 1993 de Joseph Ruben, O Bom Filho (The Good Son), com argumento originalmente escrito por Ian McEwan, me coubesse o mesmo papel da actriz Wendy Crewson segurando, à beira do abismo, Macaulay Culkin (o filho) e Elijah Wood (o sobrinho), rendidos neste caso por Eastwood e Scorsese (a ordem dos eminentes realizadores é irrelevante, para não converter em maniqueísta esta contenda fílmica), suponho que a minha decisão era deixar-me cair com os meus provectos amigos – passaria, como é óbvio, a fazer companhia a Booth, Manson, Oswald, Chapman, e quejandos, na historiografia criminal norte-americana.

Clint

Se tivesse de eleger um único filme, dos cerca de trinta, realizados por Eastwood como o meu preferido, talvez a escolha brotasse da minha mente de forma espontânea, sem medir prós e contras, e de exercer a inevitável comparabilidade que estraga a espontaneidade da resposta: Meia-Noite no Jardim do Bem e do Mal (Midnight in the Garden of Good and Evil, 1997). Mas, se a tivesse de proferir de viva voz, nem que fosse em surdina, permaneceria para todo o sempre o travo amargo da injustiça na minha boca.
E Um Mundo Perfeito (A Perfect World, 1993)? E o filme que funcionou como o grande ponto de viragem de Eastwood para o Olimpo, o caminho para a perfeição na realização, Caçador Branco, Coração Negro (White Hunter, Black Heart, 1990)? E o seu prenunciador Fim do Sonho (Bird, 1988)? E Mystic River (2003)? Então… afinal o Meia-Noite… mas ainda há As Cartas de Iwo Jima (Letters from Iwo Jima, 2006)…
Jamais pararia por ali, neste ciclo de dúvidas, assaz inútil, talvez divertido no seu início, mas extremamente entediante com o passar do tempo, como uma cobaia a repetir os passos no seu labirinto translúcido de acrílico aos olhos do manipulador, cientista, dissecador de comportamentos.
Talvez fosse mais fácil pronunciar-me sobre os que não gostei pós-1988 (ou 90), mas iria decerto ser crucificado – e Cristo, dizem, houve apenas um, e Esse descerá ainda este ano à Terra como prometera… Marcelo será presidente do PSD, e as trombetas apocalípticas e o terrível odor a enxofre deixar-me-iam paralisado de medo, e nem a promessa de ambrósia à discrição, assegurada e certificada por organismo celestial competente, me deixariam cometer tamanho sacrilégio.

PS – Hoje, ou talvez amanhã, o último dos jogos florais, que constituíram, na sua invisibilidade aparente, a causa de tudo isto sobre o que estivemos até então a falar.

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