sábado, 18 de março de 2006

Botellón

Estava apenas há uma semana instalado em Madrid, quando numa sexta-feira depois de um bom repasto me dirigia à estação de metro da Moncloa para regressar a casa e poder finalmente deitar a cabeça na almofada.
Nos jardins da Moncloa uma horda de estudantes apenas deixava entrever escassos metros quadrados de relva por ocupar. Carregavam sacos de plástico, daqueles que se oferecem nos hipermercados, que dado o peso do material transportado poderiam rebentar a qualquer momento.
Estupefacto, detive-me naquele ponto estratégico da Calle Princesa, por um curto mas suficiente espaço de tempo, mirando do alto privilegiado a área confinada pelo Paseo Moret, a Avenida Victoria e a Avenida Séneca, movido por uma irreprimível curiosidade sociológica.
Aquele amontoado, aparentemente anárquico, de jovens, entre os dezassete e vinte muitos anos, era, no entanto, formado por centenas de pequenas rodas quase perfeitas e indistintas de rapazes e raparigas, que seguravam, com um zeloso afinco, um mega copo de plástico onde previamente haviam preparado um cocktail explosivo de rum, tequila, gin, vodka, absinto e whisky, meticulosamente suavizado com refrigerantes e colas.
Perguntei qual a razão de ser daquele amontoado. Responderam-me que era pelo simples prazer do convívio ao ar livre e que, assim, se poderia juntar o prazer de beber e de fumar – não só tabaco – por um preço irrisório. Está claro que, desde logo, me apercebi de que aquele último era o motivo principal.
Mais tarde pude testemunhar algumas das sequelas do botellón. Pelos jardins a relva transformara-se num mar de copos de plástico e de garrafas de bebidas espirituosas e de refrigerantes. Porém, havia retardatários nadando em poças do seu – penso eu – próprio vómito. Outros estavam prostrados à sombra lunar de um carvalho, de um plátano ou de uma tília. Mais à frente alguns jovens casais copulavam num despudor que só lhes era permitido pela abundância de álcool e de substâncias psicotrópicas que circulavam naquelas veias ainda fortes e resistentes pela parca idade biológica.
Contudo, houve uma certa manhã em que acordei com a notícia de que essas práticas licenciosas passariam a ser proibidas. O famoso botellón soltaria, por certo, o seu último estertor por aqueles dias.
E assim se sucedeu,
se bem que…

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