Já nada me surpreende no mundo da 7.ª arte. Talvez me seja difícil, aqui e agora, conseguir divisar o marco para a irremediável perda de fé nalguma consistência nas artes cinematográficas, concretamente na carreira dos realizadores que acompanhamos, admiramos e nos transportam, através do sortilégio das suas obras, para longe de uma realidade, de um quotidiano que nos (me) vai asfixiando – libertar as pulsões que, de outro modo, deixam marcas de reverberação cujo recalcamento tem o implacável poder de avivar uma dor que não se extingue.
Tudo isto se resume a um problema molecular. Por exemplo, o agravamento do meu espírito saturnino levou-me a proferir as inanidades melodramáticas escritas no final do anterior parágrafo. É do ozono: três moléculas de oxigénio que instabilizam a vida na Terra. Um simples átomo de oxigénio que se acrescenta à sua molécula, um “e” que cai que não me permite continuar a tergiversar e a tentar ser engraçado com o apelido do benfazejo realizador francês, François de seu nome, nascido em Paris no ano da Graça de 1967.
Um longo período de publicidade e de trailers de filmes em exibição ou com exibição iminente. Letras do genérico rosa fúchsia estilizadas, barrocas e um som de fundo que me deixam a olhar de esguelha para o ecrã e a pensar nos penosos 135 minutos que irei passar naquele ambiente artificial. Romola Garai… curioso, este nome pindérico diz-me qualquer coisa… Sam Neill… Charlotte Rampling… cadavérica... um outro que nasceu com um apelido com um possível erro ortográfico, um tal de Fassbender… based on a novel by Elizabeth Taylor… Diamantes, lantejoulas, lamechices, Michael Jackson, gatos e laçarotes. Estava tudo lá, se exceptuarmos, é claro, o caucasiano ex Jackson Five.
Os minutos passam, as dúvidas desfazem-se. Trata-se, de facto, de um melodrama de quinta categoria, cuja música orquestrada de Philippe Rombi parece ser o canário na mina de carvão.
Romola… pois a tal de Romola, a sósia britânica de Carolina Salgado que vestiu a pele da personagem cruelmente expiatória Briony Tallis aos dezoito anos, quando se armou de Florence Nightingale na versão cinematográfica Joe Wright do romance de McEwan – parece que ainda a estou a ver a sair toda emplumada do seu BM X5 à porta do tribunal de Gondomar.
Com a excepção do Luís Miguel, a crítica excita-se e estrela-o no máximo – de girassol ou de soja, é um enjoo. Pois, Ozon faz pulsar a priori a veia encomiástica dos cinéfilos e críticos de cinema.
Confesso que, durante as duas intermináveis horas, estive sempre na expectativa de assistir à metamorfose do desastre melodramático num thriller psicológico viscontiano, embora sem Helmut Berger, que terminasse com uma fanfarra felliniana, ou então, num intrigante e feérico jogo de espelhos hitchcockiano. Porém, foi uma espera sem proveito, a dramalhada termina subliminarmente com o cliché de que “o dinheiro (corporizado não só nos bens e na fortuna, mas também na fama) não traz felicidade”. (Ponham-mo na mão que já vos digo por onde começo a construir a minha felicidade...)
Ah, já me ia esquecendo... A tal de Elizabeth Taylor é outra. Também nascida em Inglaterra, mas em 1912, um quarto de século antes da amiga de Neverland, bi-Burton. E já não pertence ao mundo dos vivos, nem tão-pouco à estirpe dos zombies hollywoodianos. Morreu em 1975 vitimada por um cancro e escreveu 12 romances – entre eles, The Real Life of Angel Deverell em 1957 – e alguns contos; e segundo os especialistas em literatura britânica do século passado, passou tangencialmente ao lado de se tornar na Jane Austen do século XX. Talvez as simpatias e militância vermelhas sejam o catalisador para a tentativa de entronização póstuma. Para mim, basta olhar para a colecção que a Virago (a sua editora) lançou para o mercado assim que a eminente esquecida faleceu. Pede meças à colecção de Sabrinas, com toalha de praia e chinelos floridos incorporados no pacote global, à venda no hipermercado Jumbo.
Mas, isto sou eu. A condenar a pobre senhora sem haver lido uma única linha de um dos seus romances ou contos.
Quanto a Ozon, convém que nos esqueçamos rapidamente que engendrou (argumento e realização) esta xaropada.
Nota: a coloquialidade deve-se, sobretudo, ao estado de enervamento que me provoca o simples odor a desperdício artístico, seja ele na Música, na Literatura ou no Cinema – a minha tríade sagrada nas artes.
Tudo isto se resume a um problema molecular. Por exemplo, o agravamento do meu espírito saturnino levou-me a proferir as inanidades melodramáticas escritas no final do anterior parágrafo. É do ozono: três moléculas de oxigénio que instabilizam a vida na Terra. Um simples átomo de oxigénio que se acrescenta à sua molécula, um “e” que cai que não me permite continuar a tergiversar e a tentar ser engraçado com o apelido do benfazejo realizador francês, François de seu nome, nascido em Paris no ano da Graça de 1967.
Um longo período de publicidade e de trailers de filmes em exibição ou com exibição iminente. Letras do genérico rosa fúchsia estilizadas, barrocas e um som de fundo que me deixam a olhar de esguelha para o ecrã e a pensar nos penosos 135 minutos que irei passar naquele ambiente artificial. Romola Garai… curioso, este nome pindérico diz-me qualquer coisa… Sam Neill… Charlotte Rampling… cadavérica... um outro que nasceu com um apelido com um possível erro ortográfico, um tal de Fassbender… based on a novel by Elizabeth Taylor… Diamantes, lantejoulas, lamechices, Michael Jackson, gatos e laçarotes. Estava tudo lá, se exceptuarmos, é claro, o caucasiano ex Jackson Five.
Os minutos passam, as dúvidas desfazem-se. Trata-se, de facto, de um melodrama de quinta categoria, cuja música orquestrada de Philippe Rombi parece ser o canário na mina de carvão.
Romola… pois a tal de Romola, a sósia britânica de Carolina Salgado que vestiu a pele da personagem cruelmente expiatória Briony Tallis aos dezoito anos, quando se armou de Florence Nightingale na versão cinematográfica Joe Wright do romance de McEwan – parece que ainda a estou a ver a sair toda emplumada do seu BM X5 à porta do tribunal de Gondomar.
Com a excepção do Luís Miguel, a crítica excita-se e estrela-o no máximo – de girassol ou de soja, é um enjoo. Pois, Ozon faz pulsar a priori a veia encomiástica dos cinéfilos e críticos de cinema.
Confesso que, durante as duas intermináveis horas, estive sempre na expectativa de assistir à metamorfose do desastre melodramático num thriller psicológico viscontiano, embora sem Helmut Berger, que terminasse com uma fanfarra felliniana, ou então, num intrigante e feérico jogo de espelhos hitchcockiano. Porém, foi uma espera sem proveito, a dramalhada termina subliminarmente com o cliché de que “o dinheiro (corporizado não só nos bens e na fortuna, mas também na fama) não traz felicidade”. (Ponham-mo na mão que já vos digo por onde começo a construir a minha felicidade...)
Ah, já me ia esquecendo... A tal de Elizabeth Taylor é outra. Também nascida em Inglaterra, mas em 1912, um quarto de século antes da amiga de Neverland, bi-Burton. E já não pertence ao mundo dos vivos, nem tão-pouco à estirpe dos zombies hollywoodianos. Morreu em 1975 vitimada por um cancro e escreveu 12 romances – entre eles, The Real Life of Angel Deverell em 1957 – e alguns contos; e segundo os especialistas em literatura britânica do século passado, passou tangencialmente ao lado de se tornar na Jane Austen do século XX. Talvez as simpatias e militância vermelhas sejam o catalisador para a tentativa de entronização póstuma. Para mim, basta olhar para a colecção que a Virago (a sua editora) lançou para o mercado assim que a eminente esquecida faleceu. Pede meças à colecção de Sabrinas, com toalha de praia e chinelos floridos incorporados no pacote global, à venda no hipermercado Jumbo.
Mas, isto sou eu. A condenar a pobre senhora sem haver lido uma única linha de um dos seus romances ou contos.
Quanto a Ozon, convém que nos esqueçamos rapidamente que engendrou (argumento e realização) esta xaropada.
Nota: a coloquialidade deve-se, sobretudo, ao estado de enervamento que me provoca o simples odor a desperdício artístico, seja ele na Música, na Literatura ou no Cinema – a minha tríade sagrada nas artes.
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