quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

Amiguismos?

John Banville recenseia o último romance de Martin Amis, House of Meetings, no Volume 54(3), de Março deste ano, da The New York Review of Books.

Nesta obra, Amis retrata o horror dos Gulags estalinistas pelos olhos de um ex-exilado russo, agora octogenário, milionário e a residir nos Estados Unidos, que decide, no fim da sua vida, viajar até ao local onde despendeu catorze tenebrosos anos da sua juventude na companhia do seu meio-irmão, e viu e sofreu as mais bárbaras atrocidades do regime comunista soviético. Pelo meio vagueia o espectro de uma paixão de ambos pela mesma mulher, uma garbosa judia que mais tarde será a mulher do seu irmão e que esteve na origem da prisão arbitrária deste e na consequente deportação para os campos da Sibéria, havendo sido acusado de exultar a América quando, numa fila de uma cafetaria, este se referia à mulher da sua vida a quem atribuiu o nome de código “America”. (Para mais informações, ler a recensão)

A sinopse é sugestiva. Martin Amis há muito que, por mérito próprio, dispensa quaisquer apresentações. A recensão do ilustre Banville deixou-me uma enorme expectativa da real qualidade da obra. E depois, há todo aquele delicioso jogo de “quem influencia/influenciou a escrita do autor” que, pelos escritores referenciados, enredam de forma inapelável um apaixonado pela Literatura com os seus mais insignes autores: Amis é um admirador de Vladimir Nabokov, que todavia foi influenciado no início dos anos 80 por Saul Bellow, que por sua vez procurou ser um Gustave Flaubert americano até ter escrito As Aventuras de Augie March,... and so forth

Banville termina com uma pequena queixa, se é que, como ele diz, se trata mesmo de uma queixa:

«House of Meetings is a rich mixture, all the richer for being so determinedly compressed. In fewer than 250 taut but wonderfully allusive, powerful pages Amis has painted an impressively broad canvas, and achieved a telling depth of perspective. The first-person voice here possesses an authority that is new in Amis's work. It is as if in all of his books he has been preparing for this one. In his depiction of a nation stumbling, terrified and terrifying, through rivers of its own, self-spilt blood, he delivers a judgment upon a time—our time— the spectacle of which, if it had been but glimpsed by the great figures of the Enlightenment on whose reasonings and hopes the modern world is founded, would have struck them silent with horror. Stalin and Stalin's Russia have provided Martin Amis with a subject worthy of his vision of a world which, as Joseph de Maistre has it, is "nothing but an immense altar on which every living thing must be immolated without end, without restraint, without respite, until the consummation of the world, until the extinction of evil, until the death of death,"[10] and in which, in the cruelest of Wildean ironies, the victims of tyranny survive to become tyrants in their turn, destroying even those whom they love most dearly. It is a bleak vision, assuredly, yet as always in the case of a true work of art, our encounter with Amis's dystopia is ultimately invigorating.»

(nota: olha quem fala! O tal que escreveu uma obra-prima, vencedora do Booker, com cerca de 200 páginas na versão original inglesa – na portuguesa conta com 176 páginas.)

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