O poeta indigente que denuncia, de forma desabrida, a indigência mental da sociedade americana que lhe foi contemporânea.
Henry Chinaski não é um pseudónimo de Charles Bukowski, é o seu alter-ego, é o receptor no papel das suas atribulações autobiográficas: alcoólico, boémio e fodilhão inveterado.
Em 1964, Sartre recusou o Nobel da Literatura alegando a institucionalização dos seus escritos como principal motivo, as grilhetas intelectuais jamais o deixariam produzir em liberdade. Todavia, há quem interprete o acto de recusa como uma eminente exacerbação da sua soberba, do seu ego inflado. Sartre era um revolucionário pelas palavras e actos, um agitador social com estranhas amizades. Um dia afirmou que Bukowski era o maior poeta americano, porém Bukowski recusou-se a um rendez-vous com o inefável pensador francês – ver aqui a informação.
Este é o lado encantador de Bukowski, o eterno irreverente e destruidor de convenções e de ufanos intelectualismos.
Um exemplo:
Em A sul de nenhum norte, Chinaski desafia Hemingway para um combate (pp. 107-108):
«Levantei-me e subi lentamente a coxia. Ergui o braço e toquei ao de leve no flanco de Hemingway.
– Sr. Hemingway…?
– Sou, o que é?
– Gostava de trocar uns socos consigo.
– Tens alguma experiência de boxe?
– Não.
– Vai ver se aprendes alguma coisa primeiro.
– Eu estou aqui para o correr aos pontapés.»
Chinaski derrota o velho Ernie por KO e enquanto este último se mantém insconsciente é convidado por um crítico do The New York Times para publicar os seus contos. Ernie – carinhoso petit nom com que Chinaski se dirige a Ernest Hemingway – parece querer despertar da modorra (pág. 111):
«Vesti-me e, nessa altura, Ernie recuperou os sentidos.
– Que raio se passou? – perguntou ele.
– Sr. Hemingway, encontrou um homem bastante bom pela frente – disse um tipo.
Acabei de vestir-me [Chinaski] e dirigi-me à mesa onde ele [Ernie] estava deitado.
– Você é bom, Pai Hemingway. Não se pode vencer sempre – disse eu, apertando-lhe a mão. Não estoure com os miolos.»
Esta passagem do conto “Classe” é simplesmente deliciosa.
Nota: no blogue Data deixarei, ainda hoje, mais um curto e genial diálogo entre Chinaski e Hemingway, referente ao conto “Não tenho pescoço e sou mau com’às cobras”* – também inserido em A sul de nenhum norte –, quando estes se encontram num bar de uma ilha turística e o primeiro diz ao segundo (pág. 243): «pensei que tinhas estoirado a cabeça com uma espingarda!»
Referência completa
Charles Bukowski, A Sul de nenhum Norte: Histórias da Vida Subterrânea, Relógio D’Água, 1.ª edição, Outubro de 1997, 323 pp. [Tradução de Manuel Resende] (South of no North, 1973).
Henry Chinaski não é um pseudónimo de Charles Bukowski, é o seu alter-ego, é o receptor no papel das suas atribulações autobiográficas: alcoólico, boémio e fodilhão inveterado.
Em 1964, Sartre recusou o Nobel da Literatura alegando a institucionalização dos seus escritos como principal motivo, as grilhetas intelectuais jamais o deixariam produzir em liberdade. Todavia, há quem interprete o acto de recusa como uma eminente exacerbação da sua soberba, do seu ego inflado. Sartre era um revolucionário pelas palavras e actos, um agitador social com estranhas amizades. Um dia afirmou que Bukowski era o maior poeta americano, porém Bukowski recusou-se a um rendez-vous com o inefável pensador francês – ver aqui a informação.
Este é o lado encantador de Bukowski, o eterno irreverente e destruidor de convenções e de ufanos intelectualismos.
Um exemplo:
Em A sul de nenhum norte, Chinaski desafia Hemingway para um combate (pp. 107-108):
«Levantei-me e subi lentamente a coxia. Ergui o braço e toquei ao de leve no flanco de Hemingway.
– Sr. Hemingway…?
– Sou, o que é?
– Gostava de trocar uns socos consigo.
– Tens alguma experiência de boxe?
– Não.
– Vai ver se aprendes alguma coisa primeiro.
– Eu estou aqui para o correr aos pontapés.»
Chinaski derrota o velho Ernie por KO e enquanto este último se mantém insconsciente é convidado por um crítico do The New York Times para publicar os seus contos. Ernie – carinhoso petit nom com que Chinaski se dirige a Ernest Hemingway – parece querer despertar da modorra (pág. 111):
«Vesti-me e, nessa altura, Ernie recuperou os sentidos.
– Que raio se passou? – perguntou ele.
– Sr. Hemingway, encontrou um homem bastante bom pela frente – disse um tipo.
Acabei de vestir-me [Chinaski] e dirigi-me à mesa onde ele [Ernie] estava deitado.
– Você é bom, Pai Hemingway. Não se pode vencer sempre – disse eu, apertando-lhe a mão. Não estoure com os miolos.»
Esta passagem do conto “Classe” é simplesmente deliciosa.
Nota: no blogue Data deixarei, ainda hoje, mais um curto e genial diálogo entre Chinaski e Hemingway, referente ao conto “Não tenho pescoço e sou mau com’às cobras”* – também inserido em A sul de nenhum norte –, quando estes se encontram num bar de uma ilha turística e o primeiro diz ao segundo (pág. 243): «pensei que tinhas estoirado a cabeça com uma espingarda!»
Referência completa
Charles Bukowski, A Sul de nenhum Norte: Histórias da Vida Subterrânea, Relógio D’Água, 1.ª edição, Outubro de 1997, 323 pp. [Tradução de Manuel Resende] (South of no North, 1973).
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