De José Maria (de Moura) Eça (e Cunha) de Queiroz:
Meu caro e Nóbel (e vai assim para evitar a irritante palavra que tu insistes em agudizar, recorrendo às regras de acentuação num nome próprio estrangeiro…) companheiro das letras,
Decorridos seis anos resolvi responder-te. Aqui o Virgílio – meu companheiro de deambulações etéreas – é assinante do JL e não tardou a retomar as suas investidas munindo-se das habituais piadas – de um desagradável humor escarninho, diga-se – a propósito da republicação de uma dita carta aberta – já antevejo, com alguma ansiedade, o dia em que, usando da minha diplomacia inata, terei de mexer uns cordelinhos para o enviar, em definitivo, para o Inferno com aquele seu italianito emproado que só fala em verso e numa tal de Beatriz (imagina que já escreveu para cima de cem volumes de uma obra que baptizou de Vita Caelestis).
Virgílio impeliu-me, sem o professar, ao exercício do direito de resposta à tua supostamente irrespondível carta. Porém, deixa-me dizer que, apesar dos teus exercícios literários niilistas – eu sei, fui violento –, há vida depois da morte, se bem que não te possa exibir à evidência a forma como ela se materializa. Não se trata de um segredo arcano ao qual jurámos fidelidade após a ascensão, porquanto as tuas limitações de ser corpóreo e mundano jamais te permitirão alcançar a gnose de tão alto empreendimento.
Antes de prosseguir com as questões que me inquietaram após a leitura do teu exercício literário, que, por certo, despertou em ti a soberba da erudição num país que julgas ser composto por pessoas de um olho só, dispondo tu de dois, gostaria que soubesses que li as recensões e os resumos de todas as tuas obras, prodigiosamente preparados pelo Arcanjo Gabriel. Confesso-te que tenho a vista cansada de ler parágrafos inteiros sem pontuação.
Voltando à tua missiva, há um conjunto de questões que gostaria de te colocar:
Em primeiro lugar, julgas-te o Segismundo – que ainda conheci por mundos terrenos enquanto fervoroso estudante da histeria, sob a asa protectora de Breuer –, um psicanalista que faz a apologia da dissecação da personalidade por um rebuscado uso da hermenêutica nos meus escritos?
Depois, falas-me num tom jocoso, não escondendo alguma presunção que te é tão típica, quando me tentas ensinar o que é um fax e qual é a sua utilidade. Julgas que não sei o que isso é? Pois fica sabendo que dos serafins ao Altíssimo, passando pelos catecúmenos recentemente admitidos e pelo selectivo P.E.N./Celestial, somos anjinhos cibernéticos certificados por S. Pedro desde que este abriu os Portões ao Bill. E, porventura, sabias que obtive do Arcanjo Rafael, Deus o guarde eternamente junto de si, a necessária autorização para negociar com o teu especial amigo terráqueo Pacheco Pereira para que juntos empreendamos um esboço de um blogue de minha autoria, como medida terapêutica para as minhas atribulações etéreas?
Finalmente – e podes achar isto uma minudência – quando dizes a dado passo que, supostamente, foi a minha querida ama que me «lavou a caca dos cueiros», não poderias ter sido mais subtil? Se pretendias, com orgulho, usar um empolamento literário recorrendo à linguagem do povo, porque não utilizaste “merda”? “Caca” soa mal, é brejeiro e de uma grosseria estridulosa.
Não queria terminar sem te deixar com uma confidência e um conselho. A confidência resulta de um pensamento que venho amadurecendo ao longo destes seis anos: suponho que, no teu caso, já não te conseguimos endireitar simplesmente com um suave milagre, e muito menos com uma alargada estância em Cuba – das Caraíbas – junto do teu Fidel amigo. Quanto ao conselho, e suponho que a minha autoridade divinamente sancionada mo permite fazer, julgo que deverias orientar o teu afilhado, o Gonçalo, naquela sua, muito febril, compulsão publicista. Já ultrapassou as raias do exagero e, podes crer, já é motivo de copiosas risadas paradisíacas aqui no éden. No meu caso – e faço-te mais uma confissão, e sem cobrar – já não me ria tanto desde a publicação do Bilhete de Identidade daquela que, aí por baixo, recenseia, prefacia, estuda e edita escritos de minha autoria.
Sou, muito atentamente, teu despretensioso mestre,
José Maria
Meu caro e Nóbel (e vai assim para evitar a irritante palavra que tu insistes em agudizar, recorrendo às regras de acentuação num nome próprio estrangeiro…) companheiro das letras,
Decorridos seis anos resolvi responder-te. Aqui o Virgílio – meu companheiro de deambulações etéreas – é assinante do JL e não tardou a retomar as suas investidas munindo-se das habituais piadas – de um desagradável humor escarninho, diga-se – a propósito da republicação de uma dita carta aberta – já antevejo, com alguma ansiedade, o dia em que, usando da minha diplomacia inata, terei de mexer uns cordelinhos para o enviar, em definitivo, para o Inferno com aquele seu italianito emproado que só fala em verso e numa tal de Beatriz (imagina que já escreveu para cima de cem volumes de uma obra que baptizou de Vita Caelestis).
Virgílio impeliu-me, sem o professar, ao exercício do direito de resposta à tua supostamente irrespondível carta. Porém, deixa-me dizer que, apesar dos teus exercícios literários niilistas – eu sei, fui violento –, há vida depois da morte, se bem que não te possa exibir à evidência a forma como ela se materializa. Não se trata de um segredo arcano ao qual jurámos fidelidade após a ascensão, porquanto as tuas limitações de ser corpóreo e mundano jamais te permitirão alcançar a gnose de tão alto empreendimento.
Antes de prosseguir com as questões que me inquietaram após a leitura do teu exercício literário, que, por certo, despertou em ti a soberba da erudição num país que julgas ser composto por pessoas de um olho só, dispondo tu de dois, gostaria que soubesses que li as recensões e os resumos de todas as tuas obras, prodigiosamente preparados pelo Arcanjo Gabriel. Confesso-te que tenho a vista cansada de ler parágrafos inteiros sem pontuação.
Voltando à tua missiva, há um conjunto de questões que gostaria de te colocar:
Em primeiro lugar, julgas-te o Segismundo – que ainda conheci por mundos terrenos enquanto fervoroso estudante da histeria, sob a asa protectora de Breuer –, um psicanalista que faz a apologia da dissecação da personalidade por um rebuscado uso da hermenêutica nos meus escritos?
Depois, falas-me num tom jocoso, não escondendo alguma presunção que te é tão típica, quando me tentas ensinar o que é um fax e qual é a sua utilidade. Julgas que não sei o que isso é? Pois fica sabendo que dos serafins ao Altíssimo, passando pelos catecúmenos recentemente admitidos e pelo selectivo P.E.N./Celestial, somos anjinhos cibernéticos certificados por S. Pedro desde que este abriu os Portões ao Bill. E, porventura, sabias que obtive do Arcanjo Rafael, Deus o guarde eternamente junto de si, a necessária autorização para negociar com o teu especial amigo terráqueo Pacheco Pereira para que juntos empreendamos um esboço de um blogue de minha autoria, como medida terapêutica para as minhas atribulações etéreas?
Finalmente – e podes achar isto uma minudência – quando dizes a dado passo que, supostamente, foi a minha querida ama que me «lavou a caca dos cueiros», não poderias ter sido mais subtil? Se pretendias, com orgulho, usar um empolamento literário recorrendo à linguagem do povo, porque não utilizaste “merda”? “Caca” soa mal, é brejeiro e de uma grosseria estridulosa.
Não queria terminar sem te deixar com uma confidência e um conselho. A confidência resulta de um pensamento que venho amadurecendo ao longo destes seis anos: suponho que, no teu caso, já não te conseguimos endireitar simplesmente com um suave milagre, e muito menos com uma alargada estância em Cuba – das Caraíbas – junto do teu Fidel amigo. Quanto ao conselho, e suponho que a minha autoridade divinamente sancionada mo permite fazer, julgo que deverias orientar o teu afilhado, o Gonçalo, naquela sua, muito febril, compulsão publicista. Já ultrapassou as raias do exagero e, podes crer, já é motivo de copiosas risadas paradisíacas aqui no éden. No meu caso – e faço-te mais uma confissão, e sem cobrar – já não me ria tanto desde a publicação do Bilhete de Identidade daquela que, aí por baixo, recenseia, prefacia, estuda e edita escritos de minha autoria.
Sou, muito atentamente, teu despretensioso mestre,
José Maria
2 comentários:
Boa, AMC. Mas eu diria mais. “Caca” não só soa mal e é brejeiro e de uma grosseria estridulosa. É apenas uma forma apaneleirada de dizer "merda".
:)
Henrique,
E eu que, num destes dias, repreendi a minha filha (3 anos) por lhe ter saído essa palavra da boca...
Pronto, não consigo explicar o meu ódio de estimação a essa palavra!
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