Christopher Orr, crítico de cinema da The New Republic, escreve sobre a adaptação cinematográfica de um dos melhores romances de sempre – opinião pessoal e dificilmente alterável por mais tempo que a vida me reserve. Atonement de Ian McEwan estreou ontem no grande ecrã nos Estados Unidos, realizado por Joe Wright, com argumento a cargo do luso-britânico Christopher Hampton e com as interpretações da insossa delicodoce Keira Knightley (no papel de Cecilia Tallis), do ainda duvidoso James McAvoy (no papel de Robbie Turner) e com Vanessa Redgrave (interpretando Briony Tallis na sua fase mais angustiante e dilacerante, e isto aplica-se a qualquer leitor com um mínimo de sensibilidade, ou seja, "acima da Stallone").
Orr começa o seu artigo de forma irónica, embora formalmente errada pela contagem de palavras que “1935”, um número, atrapalha: «Atonement opens in 1935, at a stately manor in the English countryside. (Have I just explained in a dozen words why it will be nominated for Best Picture? Perhaps I have.)» (dispenso-me à tradução).
Possivelmente, vem aí uma decepção para os mcewanianos (grupo em que me incluo sem reservas) ou para os avassalados por Expiação.
Sem querer passar por um agoirento de quinta categoria, ou então, um daqueles que esperam por opinião validada para conformar a sua, cedo desconfiei deste produto cinematográfico: Wright e Knightley, Orgulho e Preconceito, pretensão de chegar ao “patamar Ivory” num filme de época baseado numa obra de romancista consagrado, apesar de Hampton. Em suma, muita beijoquice e toque sensual reprimido, com guarda-roupa a puxar à memória o horrível odor a naftalina, de elocução quase shakespeariana, em jardins soalheiros e luxuriantes.
No subtítulo, Orr diz que «a fidelidade canina [do realizador] a um grande livro não faz um grande filme». E mais adiante, no corpo do artigo, explica: «O que falta ao filme é a prosa e a ingenuidade de McEwan, cujo literalismo de Wright não consegue alcançar. Ele transcreve fielmente o romance para o ecrã, mas nunca encontra uma linguagem cinematográfica – não, o martelar da máquina de escrever não conta – que poderia fazer do filme algo mais que uma obra de arte em segunda mão, um livro filmado.» [tradução: AMC]
E voltamos uma vez mais ao tema quente da interpenetração da Literatura e do Cinema – o substantivo empregado é o correcto, dada a bidireccionalidade relacional, apesar de aqui se invocar apenas uma das vertentes –, dos graus de liberdade na adaptação de uma obra consagrada ao grande ecrã, redundando sempre no preso por ter cão…
Se assim é, é uma pena. E depois, transformar a culpa íntima e perpétua, profunda e pungente, de Briony, a alma da obra-prima de McEwan, num processo expiatório dentro de um talk show televisivo é no mínimo burlesco, para não dizer profano, especialmente quando se abusa do literalismo adaptativo.
Entretanto, as vacas, esses bichos ruminantes impenitentes, continuarão a pastar celulóide nas colinas de Hollywood.
Orr começa o seu artigo de forma irónica, embora formalmente errada pela contagem de palavras que “1935”, um número, atrapalha: «Atonement opens in 1935, at a stately manor in the English countryside. (Have I just explained in a dozen words why it will be nominated for Best Picture? Perhaps I have.)» (dispenso-me à tradução).
Possivelmente, vem aí uma decepção para os mcewanianos (grupo em que me incluo sem reservas) ou para os avassalados por Expiação.
Sem querer passar por um agoirento de quinta categoria, ou então, um daqueles que esperam por opinião validada para conformar a sua, cedo desconfiei deste produto cinematográfico: Wright e Knightley, Orgulho e Preconceito, pretensão de chegar ao “patamar Ivory” num filme de época baseado numa obra de romancista consagrado, apesar de Hampton. Em suma, muita beijoquice e toque sensual reprimido, com guarda-roupa a puxar à memória o horrível odor a naftalina, de elocução quase shakespeariana, em jardins soalheiros e luxuriantes.
No subtítulo, Orr diz que «a fidelidade canina [do realizador] a um grande livro não faz um grande filme». E mais adiante, no corpo do artigo, explica: «O que falta ao filme é a prosa e a ingenuidade de McEwan, cujo literalismo de Wright não consegue alcançar. Ele transcreve fielmente o romance para o ecrã, mas nunca encontra uma linguagem cinematográfica – não, o martelar da máquina de escrever não conta – que poderia fazer do filme algo mais que uma obra de arte em segunda mão, um livro filmado.» [tradução: AMC]
E voltamos uma vez mais ao tema quente da interpenetração da Literatura e do Cinema – o substantivo empregado é o correcto, dada a bidireccionalidade relacional, apesar de aqui se invocar apenas uma das vertentes –, dos graus de liberdade na adaptação de uma obra consagrada ao grande ecrã, redundando sempre no preso por ter cão…
Se assim é, é uma pena. E depois, transformar a culpa íntima e perpétua, profunda e pungente, de Briony, a alma da obra-prima de McEwan, num processo expiatório dentro de um talk show televisivo é no mínimo burlesco, para não dizer profano, especialmente quando se abusa do literalismo adaptativo.
Entretanto, as vacas, esses bichos ruminantes impenitentes, continuarão a pastar celulóide nas colinas de Hollywood.
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