sábado, 26 de setembro de 2009

Follas Novas

Pormenor do interior da livraria Follas Novas, Santiago de Compostela, EspanhaQuando visitava Santiago (há, pelo menos, nove ou dez anos que não ponho lá os pés), um dos pontos imprescindíveis do roteiro turístico era a livraria “Follas Novas” – a Díaz de Santos ficava sempre para segundo plano.
Independentemente da denominação impudica em castelhano – o nome da loja está em galego, em espanhol seria qualquer coisa como “Hojas Nuevas” –, e dos trocadilhos mais ou menos infelizes a que isso dava origem, havia sempre uma visita à bem apetrechada livraria de Montero Ríos, com os livreiros mais bem preparados e qualificados que encontrei de todas as livrarias que visitei até aos dias de hoje – naquela livraria existiam verdadeiras bases de dados antropomórficas.

Para quem irá ler o romance enciclopédico de Roberto Bolaño, 2666, recentemente publicado em Portugal – já o li na sua língua original e talvez leia a versão portuguesa – irá reparar, no segundo livro “La parte de Amalfitano”, na breve referência que é feita à livraria, quando Amalfitano abre a caixa que continha os seus livros e surge misteriosamente um livro de um tal Rafael Dieste, cujo título era Testamento geométrico – parte importante da narrativa:

«Buscó en la primera página y en la última y en la contraportada alguna señal y encontró, en la primera página, la etiqueta cortada de la Librería Follas Novas, S.L., Montero Ríos 37, teléfonos 981-59-44-06 y 981-59-44-18, Santiago. Evidentemente no Santiago de Chile, único lugar del mundo en donde Amalfitano era capaz de verse a sí mismo en un estado de catatonia total, capaz de entrar en una librería, coger un libro cualquiera sin siquiera mirar la portada, pagarlo y marcharse.
»Se trataba, era obvio, de Santiago de Compostela, en Galicia.»
Roberto Bolaño, 2666 (Barcelona: Anagrama, 2004, 1126 pp.)

Lembro-me bem de uma das últimas visitas – talvez até a última –, muito próxima da quadra natalícia, quando encontrei na “Follas Novas” uma magnífica fotobiografia de James Osterberg, mais conhecido por Iggy Pop, com texto traduzido em castelhano.
Serviria de presente. O destinatário estava escolhido. E, naquela noite de 24 de Dezembro, houve um par de olhos que brilhou com maior intensidade pela sua veneração musical à “Iguana”. Esse par cuja fulgência se apagou, em definitivo, há quase 7 anos… Razão de ser tudo isto que para aqui despejo.