Quando em 2004 a Editorial Teorema deu início à publicação da curta obra deixada por Winfried Georg Maximilian Sebald (1944-2001), mais conhecido nos meios literários por W. G. Sebald, começou precisamente pela sua obra mais aclamada e a última publicada em vida, Austerlitz (2001), um romance deambulatório, onde se entrecruzam, como em toda a sua obra, o campo ficcional e a realidade, retratando as peregrinações do personagem epónimo e das suas curiosas relações com o autor.
Em Portugal assistiu-se a uma verdadeira febre sebaldiana despoletada pelas palavras de exultação estética dos ditos intelectuais deste ínfimo país ainda mais parco, pela baixíssima fasquia intelectual, de cabeças pensantes.
Poder-se-ia considerar que o atractivo, que normalmente engrandece a obra do autor, residiu no seu fim trágico. Com efeito, Sebald faleceu num acidente de automóvel em Norwich, Inglaterra – país onde residia desde 1970 –, no dia 14 de Dezembro de 2001. Todavia, arrisco que um dos factores que esteve na origem da admiração incondicional pode ter tido que ver com a putativa hermeticidade da narrativa aos não iniciados da corrente literário-intelectual lusa, ou seja, inalcançável aos espíritos mais obtusos da miserável plebe.
Eu explico-me. Sebald passou a ser entendido como uma marca distintiva, a fronteira entre a afirmação da intelectualidade e o simples gosto, meramente romanesco, de certa forma frívolo e superficial, pela Literatura. Em suma, eu sebaldo, logo tenho autoridade literária.
De todas as obras do escritor germânico e publicadas em Portugal, confesso que entre as que menos apelaram a uma certeza de encanto ou à minha exteriorização, sob que forma fosse, de um fascínio literário conta-se, precisamente, Austerlitz. Todavia, seria deveras indecente e falacioso afirmar que não gostei do romance na sua totalidade, mas também não tenho qualquer pejo em asseverar que a dita obra em nada contribuiu para o engrandecimento da minha cultura literária – ou o que se lhe quiser chamar.
Por outro lado, a obra Os Anéis de Saturno, publicada em 2006 pela Teorema, é de um enfado e de uma banalidade auto-indulgente, pontuada, no entanto, por algumas passagens reconhecidamente brilhantes. No mesmo ano, a mesma editora publicou a extraordinária História Natural da Destruição, de tom eminentemente ensaísta, Sebald percorre os horrores da II Guerra Mundial não se furtando à análise da devastação infligida pela força aérea dos Aliados em cidades alemãs como Hamburgo e Dresden, para além de fazer um minucioso retrato dos autores e da Literatura alemã durante e após o conflito.
Finalmente, não li Os Emigrantes.
Em Vertigens. Impressões, Sebald, parte de personagens reais como Franz Kafka e Stendhal (Henri Beyle), através das viagens que empreendeu na década de 1980 por Viena, Veneza, Verona, Riva e até uma deliciosa história sobre a sua estância nas margens do lago Garda, para terminar com uma brilhante narração da deambulação pela sua terra natal Wertach, na Baviera, e das pungentes reminiscências, indelevelmente marcadas na sua memória, assim como a do seu confronto com a realidade, a luta entre o retrato que os sentidos nela gravaram e aquilo que eles agora transmitem que, quer por corroboração, quer por uma dolorosa refutação, têm a capacidade de agitar o fundo daquilo que julgáramos ser, sob a forma de uma vertigem que simultaneamente nos paralisa e angustia.
Em Portugal assistiu-se a uma verdadeira febre sebaldiana despoletada pelas palavras de exultação estética dos ditos intelectuais deste ínfimo país ainda mais parco, pela baixíssima fasquia intelectual, de cabeças pensantes.
Poder-se-ia considerar que o atractivo, que normalmente engrandece a obra do autor, residiu no seu fim trágico. Com efeito, Sebald faleceu num acidente de automóvel em Norwich, Inglaterra – país onde residia desde 1970 –, no dia 14 de Dezembro de 2001. Todavia, arrisco que um dos factores que esteve na origem da admiração incondicional pode ter tido que ver com a putativa hermeticidade da narrativa aos não iniciados da corrente literário-intelectual lusa, ou seja, inalcançável aos espíritos mais obtusos da miserável plebe.
Eu explico-me. Sebald passou a ser entendido como uma marca distintiva, a fronteira entre a afirmação da intelectualidade e o simples gosto, meramente romanesco, de certa forma frívolo e superficial, pela Literatura. Em suma, eu sebaldo, logo tenho autoridade literária.
De todas as obras do escritor germânico e publicadas em Portugal, confesso que entre as que menos apelaram a uma certeza de encanto ou à minha exteriorização, sob que forma fosse, de um fascínio literário conta-se, precisamente, Austerlitz. Todavia, seria deveras indecente e falacioso afirmar que não gostei do romance na sua totalidade, mas também não tenho qualquer pejo em asseverar que a dita obra em nada contribuiu para o engrandecimento da minha cultura literária – ou o que se lhe quiser chamar.
Por outro lado, a obra Os Anéis de Saturno, publicada em 2006 pela Teorema, é de um enfado e de uma banalidade auto-indulgente, pontuada, no entanto, por algumas passagens reconhecidamente brilhantes. No mesmo ano, a mesma editora publicou a extraordinária História Natural da Destruição, de tom eminentemente ensaísta, Sebald percorre os horrores da II Guerra Mundial não se furtando à análise da devastação infligida pela força aérea dos Aliados em cidades alemãs como Hamburgo e Dresden, para além de fazer um minucioso retrato dos autores e da Literatura alemã durante e após o conflito.
Finalmente, não li Os Emigrantes.
Em Vertigens. Impressões, Sebald, parte de personagens reais como Franz Kafka e Stendhal (Henri Beyle), através das viagens que empreendeu na década de 1980 por Viena, Veneza, Verona, Riva e até uma deliciosa história sobre a sua estância nas margens do lago Garda, para terminar com uma brilhante narração da deambulação pela sua terra natal Wertach, na Baviera, e das pungentes reminiscências, indelevelmente marcadas na sua memória, assim como a do seu confronto com a realidade, a luta entre o retrato que os sentidos nela gravaram e aquilo que eles agora transmitem que, quer por corroboração, quer por uma dolorosa refutação, têm a capacidade de agitar o fundo daquilo que julgáramos ser, sob a forma de uma vertigem que simultaneamente nos paralisa e angustia.
«Por isso, aconselha Beyle, não devemos comprar gravuras com as lindas vistas ou perspectivas que observamos em viagem. É que uma gravura depressa ocupa por inteiro o lugar da lembrança que temos das coisas, pode-se até dizer que acaba por a destruir.» (pág. 11)
Classificação: ***** (Muito Bom)
Referência bibliográfica:
W.G. Sebald, Vertigens. Impressões. Lisboa: Teorema, 1.ª edição, Fevereiro de 2007, 202 pp. (tradução de Telma Costa; obra original: Schwindel. Gefühle, 1990).
Nota: Para uma descrição mais pormenorizada da obra consultar a crítica “De Viena a Verona, na pista de Stendhal e Franz Kafka” de José Mário Silva (a crítica a seu dono) publicada no Diário de Notícias em 28 de Abril último.
Referência bibliográfica:
W.G. Sebald, Vertigens. Impressões. Lisboa: Teorema, 1.ª edição, Fevereiro de 2007, 202 pp. (tradução de Telma Costa; obra original: Schwindel. Gefühle, 1990).
Nota: Para uma descrição mais pormenorizada da obra consultar a crítica “De Viena a Verona, na pista de Stendhal e Franz Kafka” de José Mário Silva (a crítica a seu dono) publicada no Diário de Notícias em 28 de Abril último.
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