segunda-feira, 26 de março de 2007

Sinais preocupantes?

O seu nome é Paul, Paul Auster. Nova-iorquino de coração, nascido há 60 anos em Nova Jérsia na terra Natal do Mestre P. Roth, que no último dia de S. José completou 74 anos.
Em entrevista dada ao director do Instituto Cervantes de Nova Iorque, Eduardo Lago (EL), e publicada no jornal El País no início deste mês, Paul Auster (PA) termina-a dando claros sinais de alguma sintomatologia do Síndrome de Bartleby – o escrivão de Melville.
Auster confessa que depois de haver escrito Travels in the Scriptorium e de ter terminado a rodagem do filme The Inner Life of Martin Frost (produzido por Paulo Branco e filmado em Sintra) tem apenas uma pálida ideia sobre o conteúdo da sua próxima obra. Sente-se esgotado e revela uma tremenda angústia pelo fantasma do padecimento do famoso bloqueio de escritor, conjecturando mesmo sobre o seu fim no mundo das letras.
Quase ignorado na sua terra pelos seus reputados colegas de profissão e pela crítica, Auster é um dos escritores norte-americanos da actualidade mais admirados na Europa, principalmente em França, na Alemanha, em Itália e em Espanha, onde, a cada visita, as salas de leitura ou as sessões de apresentação de livros e de autógrafos se enchem sempre que o seu nome aparece em cartaz; onde a cada livro publicado os fãs se organizam em troca de opiniões e grupos de leitura, analisando as entrelinhas do acaso, marca registada do autor.
Uma detestável crítica literária inglesa* – que se amanha com afinco na sua ainda púbere arte de criticar – atribui a sua popularidade em solo europeu ao facto de os tradutores europeus de língua francesa, alemã, polaca, checa, espanhola, portuguesa, italiana ou romena, no seu afã de traduzir, de alindarem, porque só se pode melhorar, a sua prosa pobre e sem qualquer tipo de brilho. Aliás, há até um blogger/jornalista da
New York Magazine que encaixa em Auster uma famosa frase de Gore Vidal sobre Kurt Vonnegut – este último, tal como com Auster, mais amado fora do seu país – “lose something in the original.
A rapariguinha que, de quando em vez, recenseia no
The Times Literary Supplement e execra Auster, chega a afirmar que os próprios personagens de Auster são potencialmente perigosos para os seus leitores dado o seu grau de solidão e de sofrimento – depois de António Oliveira com o seu famoso assassinato por meios audiovisuais no “Caso Paula” em reportagem na SIC, haveria de ler uma recensão de uma estridente moçoila que quase faz a apologia de marca Oliveirista de homicídio pela literatura. Curiosamente, motivou uma veemente reacção por parte dos seus leitores que, com sarcasmo, se diziam verdadeiramente ameaçados pelo simples abrir das folhas de um livro do escritor de Brooklyn – outros interrogavam-na pela necessidade, quase masoquista, de ler Auster quando na realidade o detestava, demonstrando-o à saciedade, ou seja, para quem à partida o odeia, qual a razão de ter lido na íntegra os cerca de 11 romances e 5 ensaios, para além da poesia reunida? Não podem ser invocados motivos de exercício da profissão, uma vez que o preconceito anti-Auster decerto a toldará em futuras análises das suas qualidades literárias, tendo como produto final uma recensão inquinada e intelectualmente desonesta.

Eis as palavras de Auster no El País (1 de Março de 2007):
«(…)
EL: [No seu romance Travels in the Scriptorium] você reserva a aparição de Daniel Quinn, personagem de A Trilogia de Nova Iorque, para o fim. Isso significa que Travels in the Scriptorium é uma tentativa de regresso às origens, uma espécie de recapitulação de toda a sua obra?

PA: É possível… Reconheço que é uma decisão um pouco estranha. A verdade é que quando terminei As Loucuras de Brooklyn não estava no máximo das minhas forças. Tinha dúvidas sobre a minha capacidade para escrever outro romance.

EL: Porquê? Quer dizer que sua imaginação não se encontra em boa forma?

PA: Em boa verdade, não sei. Neste momento demonstro alguns sinais de esgotamento. Trabalhei muito nos últimos tempos. Escrevi o argumento de um filme que estreará em Março. Depois de Travels in the Scriptorium não comecei nada de novo. Oxalá possa continuar a escrever. Tenho algumas ideias, porém são muito vagas. Quem sabe se não terei chegado ao fim. Porventura não haverá mais romances de Paul Auster. Não sei. Oxalá não seja assim, mas neste momento nada posso assegurar.»

Um sinal preocupante para humanidade, um pequeno sinal de criação para os artistas das letras (digo eu).

Notas: *Deborah Friedell

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