sábado, 17 de março de 2007

Este caro prazer – III

Antes de prosseguir com um possível final desta sequência assaz torturante para um amante da Literatura – e o epílogo terá necessariamente de revelar aquilo que me atormenta, a ostentação da sublimação deste escriba infecundo ou, porventura, apenas temporariamente falho de ideias –, há um episódio, sem a mínima importância senão para o protagonista, bem ilustrativo da patologia de que tenho vindo a falar por subentendidos: Voragem In Litteris; bem auxiliada pelos limites infindos dos anestésicos cartões de crédito.
A
Mónica e o Sérgio já me alertaram para a indispensável introdução da variável “tempo” – neste caso a falta dele –, e na realidade o “tempo” esteve indelevelmente associado ao objectivo inicial – como demonstrarei à saciedade – desta divagação manchada pela futilidade.

O episódio que me envolveu teve a qualidade de trazer à urdidura Walser e Kerouac – passe a pretensão e a companhia, o primeiro morreu louco e o segundo morreu de bêbado. Por outro lado, envolveu Mário Dorminsky, sendo que ele não o sabe, nem tão-pouco me (re)conhece.

Dezembro de 2006, antes do Natal, por volta das 3 da tarde. Desloquei-me à casa de perdição sob o pretexto de esgotar, em definitivo, a minha lista de presentes a oferecer na noite de 24 para 25. Discos, filmes e livros encheram três cestos que a cadeia francesa põe à disposição dos clientes – mal sabendo a tremenda falha ergonómica que tal objecto encerra. Quase que me poderia escusar de referir que mais de metade dos livros iria servir para atafulhar ainda mais – Voragem In Litteris – a minha abarrotada biblioteca de livros em espera.
Primeiro baque: 270 euros (3 pontos no cartão e mais 270 para os 1500 de desconto de 6%).
Segundo baque: embrulhos e etiquetas (a necessidade de).
Terceiro baque: longa fila que Mário Dorminsky me conseguira encobrir parcialmente dada a saudável envergadura.
Terceiro baque e 1/2: ainda gastou mais que eu (pulsão voyeurística).

Kerouac, Walser e Kerouac. (Não, não se trata do Macaco poeta da preclara Preciosa! Foi mesmo assim.) Os Subterrâneos (x2) e O Ajudante. Ambos edição Relógio D’Água. Oferta, oferta para mim e para mim mesmo.
Conversa agradável com Dorminsky assim que as meninas embrulhadeiras nos colocaram lado a lado em frente à mesa a abarrotar de embrulhos de vários tamanhos e feitios. Inevitável espiadela mútua e pergunta surda: “o que é que o gajo vai ler? E oferecer? Hum!”, o importante blogger (invisível) e o eminente cinéfilo e figura pública: “Ah! Ilha de Xisto! Excelente livro! O Manuel Carvalho agradece”, disse Dorminsky. Embrulha e empresta-me a caneta… para o Pai.
Dezenas de presentes e não-presentes depois: “Bom Natal!”

Janeiro de 2007. Antes de O Engenho de Arenas (comprado na mesma data, local e momento; sem embrulho, claro!), apetecia-me antes tomar algo… O Ajudante de Walser…
Robert? Robert, por onde andas? (pergunta, porventura, acompanhada de um trautear típico de situações de alegre busca de objectos perdidos e supostamente à mão de semear).
Kerouac, Kerouac. Os Subterrâneos (x2).
FODA-SE!

Moral da história: falar com celebridades, para além de ser um súbito impulsionador de vociferação de imprecações, é causa directa de iliteracia.

Epifenómeno:Blogger is undergoing brief maintenance and will return in a few minutes”, quando quis publicar o texto... ainda não possuo O Ajudante.

(continua)

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