quinta-feira, 10 de julho de 2008

Sir Booker of Bookers

Salman Rushdie Salman Rushdie (n. Bombaim, 19 de Junho de 1947) venceu o Best of the Booker award

O escritor anglo-indiano Salman Rushdie venceu a votação para a eleição do melhor dos romances vencedores do Booker Prize (com 36% dos votos), pelo seu romance Os Filhos da Meia-Noite (Midnight's Children, 1981), na comemoração dos 40 anos do prémio literário mais prestigiado da língua inglesa (exceptuando os E.U.A.), que tem vindo a ser atribuído desde 1969 e que já premiou 41 romances (por duas vezes com vencedores ex aequo, em 1974 e 1992).
Já em 1993, a propósito da comemoração dos 25 anos de atribuição do galardão, Rushdie havia vencido o Booker dos Bookers.
Quinze anos volvidos Rushdie voltou a vencer, desta feita com a votação aberta ao público em geral, após a escolha por um júri dos 6 finalistas a concurso (que incluiu Pat Barker com The Ghost Road, 1995; Peter Carey com Oscar e Lucinda, 1988; J.M. Coetzee, Desgraça, 1999; J.G. Farrell, The Siege of Krishnapur, 1973; e Nadine Gordimer, O Conservador, 1974).

Eis um excerto do Livro Primeiro, 1.º Capítulo, “O Lençol Furado”:
«Nasci na cidade de Bombaim... um certo dia. Não, não pode ser assim. A data exacta. Nasci na maternidade do Dr. Narlikar no dia 15 de Agosto de 1947. Horas? A hora também é importante. Pois seja: foi de noite. Não, procuremos ser mais... Foi exactamente ao bater da meia-noite. Os ponteiros do relógio uniram as palmas das mãos para me cumprimentarem respeitosamente e me darem as boas-vindas. Há que dizer tudo: fui dado à luz no exacto momento em que a Índia se tomava independente. Continha-se a respiração. Do lado de fora da janela misturava-se o estralejar do fogo-de-artifício com a algazarra da multidão. Poucos segundos depois, o meu pai fracturou o dedo grande do pé; acidente insignificante em comparação com aquilo que me acontecia a mim naquele momento da noite; graças à tirania oculta dos relógios delicadamente acolhedores, eu passava a estar misteriosamente ligado à história e o meu destino indissoluvelmente unido ao do meu país. Durante as três décadas seguintes, ser-me-ia impossível escapar. A minha chegada tinha sido profetizada pelos adivinhos, celebraram-na os jornais, os políticos ratificaram a minha autenticidade. Não me foi consentido qualquer voto na matéria. Eu, Saleem Sinai, mais tarde chamado também Muco-na-Penca, Cara-Manchada, Careca, Sorve-Ranho, Buda e até Pedaço-de-Lua, fiquei definitivamente comprometido com o destino... as mais das vezes perigosamente amarrado a esse compromisso. E nessas alturas não tinha quaisquer possibilidades de me assoar.
Entretanto, o tempo (uma vez que não sei o que fazer de mim) está agora a chegar ao seu termo. Completarei em breve trinta e um anos. Se calhar. Se este meu corpo velho e escangalhado o permitir. Mas não me restam grandes esperanças de me salvar, não tenho pela frente sequer mil noites e uma noite. Tenho de ser rápido, mais rápido do que Xerazade, e é se quero deixar claro o sentido... Sim, o sentido. Não há nada que eu receie mais do que o absurdo.
»
Salman Rushdie, Os Filhos da Meia-Noite, pág. 13.
Lisboa: Dom Quixote, 4.ª edição, Maio de 2003, 428 pp. (tradução de Manuel João Gomes; obra original: Midnight's Children, 1981).

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