sexta-feira, 15 de setembro de 2006

A Grande Fraternidade

Em tempos imemoriais fui bom, apetecível… fascinante, até.
Vinte e três anos acabados de fazer, convites, encómios, galanterias, gracejos… um curso, uma vida, a emancipação e a independência; noitadas infindas, sem que me obrigasse à habitual liturgia do engate por uma noite barata, uma piscadela de olho andrógina ao barman que o compelia a oferecer bebidas num reflexo pavloviano; carro e mais noitadas sem a omnipresença policial nas ruelas da vida – só rotundas, que evitávamos – na caça ao jovem estroina com grão na asa.
Foda-se, um convite! A chave do mundo aos olhos de um adulto com cheiro a leite, contudo ufano pela ostentação dos cueiros limpos, sem a infalível mácula da condição humana.
Quiseram-me em posição altaneira atrás do púlpito. Cegueira cúpida de sobranceria académica.
Em breve… Agora, era eu que, amparado pelo grande quadro de ardósia escura – tão sombrio que realçava a minha aura –, fazia desamarrar a morrinha de gotículas de cuspo pejadas de doutrina escolástica. Opções? Futuro… perdão, futuros? Contrato através do qual…
O meu contrato de futuros era o silêncio, a suave prostração e a enérgica oblação perante os ensinamentos de uma cartilha que se servia em pacotes previamente confeccionados pela clique dos fazedores de pobres de espírito. Os grandes bloqueadores da histamina que se liberta do meu corpo pela acção das marcas indeléveis de sapiência empoadas a giz; anestesia, matam o desconforto, porém não curam a doença.
Esta seria a história da Impunidade se não houvesse erro, a opção errada, a aposta com as suas ínfimas probabilidades de sucesso. A integridade que jamais se troca ou se vende por preço algum. A consciência tranquila do caminho certo, mesmo que esse caminho me conduza para o precipício mais profundo do que o salto mais alto que as minhas pernas me permitam dar.
A aposta parecia certa, um processo de arbitragem de troca de segredos, mentiras, sórdidas cumplicidades, desejos fátuos de vida luxuosa e luxuriante. Em primeiro lugar, conquista-se pela fidelidade; depois, amarramo-lo pela partilha da carniça conquistada à custa do esforço alheio. O aprendiz de necrófago que mais tarde ensinará necrofilia, perpetuando a nossa espécie… Deus guarde as nossas almas!
Esse é o engano. A cegueira perante a novidade do brilho iridescente dos grandes valores como a integridade, a honradez e a justiça – vampiros fotossensíveis pela tal impunidade.
A integridade de um Homem poderá exigir fidelidade, porém esses Vlads com asas de anjo não sabem – e felizmente nunca saberão – que jamais alcançarão a fraternidade incondicional, cega, surda e muda perante a sordícia e o grave delito.

Vladimir Nabokov em entrevista dada a Alvin Tofler, falava na “grande fraternidade dos Medíocre Menos, espinha dorsal da nação” que, embora se referisse a assunto diverso, se poderá facilmente generalizar, corporizando-o no espelho das inúmeras faces com que se reveste a sociedade.
Ora, como já referi neste espaço inúmeras vezes, essa é precisamente a fonte geradora e potenciadora de toda a impunidade: a mediocridade que, de forma recalcitrante, não nos ensinam a saber enfrentar desde a primeira mamada em seio materno aos primeiros assentamentos do traseiro nos bancos da escola.

Como? O que é? Academicamente: Suponhamos
este caso: não me encoraja, mas também não me verga!

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