Findas as eleições presidenciais, a blogosfera voltou-se para os temas candentes do dia-a-dia e para algumas discussões etéreas que ficaram em suspenso durante o período de nojo eleitoral.
De um lado regressa a discussão eu-sou-mais-liberal-que-tu-e-o-meu-pai-também ou eu-li-mais-2579-páginas-de-Friedrich-von-Hayek-do-que-tu – ver debates e polémicas aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.
Noutro lado eclodiu a batalha da crítica literária, o papel dos meios de comunicação social, a endogamia na arte da recensão, o protagonismo mediático e o snobismo ou podes-ler-mais-livros-mas-eu-leio-os-melhores – ver este artigo de Eduardo Pitta, com referência aos restantes de Pedro Mexia, Pacheco Pereira e João Pedro George.
Quanto ao primeiro tumulto, confesso que já estou cansado, o que me leva a mexer rapidamente, quase por instinto – o cansaço leva-me por vezes a estas aparentes contradições –, a barra de deslocação do browser para que este me apresente outro texto.
Quanto à polémica da crítica literária – que acredito está apenas em fase de incubação – parece-me que algo pode ser acrescentado. Serão mais achas para a fogueira? Não, creio que não, dada a reduzida dimensão da plateia deste blogue, que, prevejo eu, jamais chegará à centena de visitas diárias.
Na crítica literária, tal como nas mais diversas áreas – acreditem –, Portugal sofre da síndrome “coça-me agora as costas para depois eu te coçar as tuas”.
No referido programa Livro Aberto da semana passada – tal como refere o leitor do Abrupto – julguei que se iria discutir a escolha literária dos espectadores do programa e/ou leitores do blogue nas quatro classificações predeterminadas – para que não restem dúvidas ver neste sítio o meu curtíssimo comentário.
No meu caso leio por puro e simples entretenimento e não por deveres profissionais ou para-profissionais. De todo o modo, sigo as recensões que se publicam – sob que meio for – em jornais, revistas, na rádio, na televisão ou na Internet, como um guia para um melhor preenchimento do tempo despendido com o meu passatempo preferido. Porém, não as sigo com uma fidelidade canina porque – e a vida já mo ensinou numa dureza inimaginável – todos nós temos os nossos interesses nas escolhas que fazemos, mesmo que procuremos cumprir, obstinadamente, o dever de isenção.
Tal como milhões de leitores anónimos, as nossas escolhas são passíveis de discussão e de análise crítica, porém não se poderão constituir como arma de arremesso na prossecução de objectivos mais ou menos obscuros.
Tal como centenas de pessoas que seguem atentamente o programa ou o blogue Livro Aberto, postei humildemente as minhas escolhas literárias para 2005 e, podem ter a certeza disso, gostaríamos que elas tivessem sido discutidas no global – as minhas centraram-se no domínio da ficção e podem ser vistas aqui.
Muitas vezes discorro em voz baixa «ainda bem que sou apenas um humilde leitor que somente torna públicas as suas preferências, sem que isso sirva de motivo para ser literariamente desancado!»
Os motivos são evidentes, e posso aqui citar dois deles:
Dentro do grupo dos 9 livros por mim escolhidos há um que despertaria as mais acesas discussões e críticas escarninhas se eu fosse uma figura pública – intermezzo lembrei-me agora de Quinn «If I were a rich man!». Falo, é claro, da minha escolha do livro editado pela Teorema em 2005 de Douglas Coupland chamado “Eleanor Rigby”. Se seguisse caninamente a crítica, chamaria Savonarola para o arremessar, com vaidade, à sua fogueira. Confesso que Coupland não é um autor da minha predilecção. Não gosto da sua forma de escrita coloquial, vista como um ícone da Geração X – que ele inventou. Nesse campo prefiro de longe as obras de Brett Easton Ellis e a sua escrita dissimuladamente verrinosa, e não tão ostensiva como a de Coupland. Porém, Eleanor Rigby apanhou-me num momento de pura fragilidade e desencadeou em mim um conjunto de emoções que necessitavam de ser expelidas, como num processo catártico. É esta interacção que sublima o meu interesse literário.
A minha secção neste blogue dedicado ao “Ritmo Editorial Português”. Nesta secção faço a contagem dos dias decorridos desde a data de publicação no idioma original de alguns livros que gostaria de ler, mas que não se encontram ainda editados e traduzidos na língua de Camões. Ora, uma vez mais, seria um alvo bastante fácil caso fosse na realidade uma figura pública. Haveria sempre alguém que me diria «Lê-o em inglês! Ele até está na Fnac ou acessível para compra na Internet!», «Pois, o inglês ou o francês passam-te ao lado!», «Foda-se, o gajo não sabe ler em inglês!». Por acaso até tenho um domínio mais do que o razoável das línguas inglesa e castelhana, e até consigo ler perfeitamente em francês – que remédio! Mas para quem gasta quase 100% do seu tempo profissional a ler em inglês, francês e castelhano e a escrever em castelhano ou inglês, divertir-se nestas línguas seria o mesmo que chamar a minha mulher e dizer-lhe «Come on, honey! I’m so horny today! Do you wanna get laid?» ou «¡Cómo me gustas cariño! ¡Fóllame!», and so on – lá está!
Bem, o que na realidade quero é que a blogosfera se anime e, como se costuma dizer, mais vale um boa contenda do que um falso consenso!
Despeço-me com o fazia EPC, dizendo: «Bons livros!»