quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Conduz-me aos verdes prados…



E a cada ano que passa há sempre pelo menos uma fantasia fúchsia, glamorosa púrpura garrida, deste calibre. Um filme inenarrável que uma pesada turba (de dedo sensível) incensa e a indústria segue – até Cannes se rendeu ao fogo-de-artifício danês, que se assemelha (e muito) à penosa e descoroçoante rendição da imprensa estrangeira acreditada em Hollywood, quando, em Dezembro do ano passado, num impulso arrebatador desferiu um golpe na 7.ª arte ao benzer, com três nomeações, o refugo fílmico O Turista (The Tourist, 2010) do promissor realizador germânico Florian Henckel von Donnersmarck.
Muito virtuosismo arraialesco dedicado pelo realizador dinamarquês ao produto final: com um argumento abaixo de sofrível; uma interpretação mil vezes repetida por Gosling (o pseudo-estóico, o passivo-insensível que chama a si todos os males para salvar o mundo, quase uma figura hierática, mono-expressiva e uma mescla de canastrão-redentor, condenado ao papel do novo messias); uma Carey Muligan desgraçadinha e lacrimejante para quem já não há pachorra. Então o restante elenco… é de uma boçalidade e histrionia gritantes, tendo como epítomes Albert Brooks e Ron Perlman Penitenziagite!
Drive – Risco Duplo (Drive, 2011) não é do pior que se fez no ano, mas seguramente é um dos filmes visualmente mais desonestos da temporada, e aí ter-se-á de tirar o chapéu a Refn, tal é o engodo que oculta a massa consistente com flashes de tuning, bem ao jeito dos amantes do oleoso Overhaulin’ e do mentor Chip Foose, que escapa ao mais incauto “estrelador” precoce.

Termino, manifestando a minha concordância completa com a avaliação do Luís Miguel Oliveira. Este péssimo produto nas mãos de um Mann talvez valesse para o gasto do bilhete e a reparação dos danos estéticos. E digo mais, até um Bryan Singer provavelmente o faria melhor. E é pena porque o realizador (agora com 41 anos), Nicolas Winding Refn, até teve um começo auspicioso no circuito internacional com o subavaliado Fear X de 2003, cujo excelente argumento foi compartilhado com o excêntrico e corrosivo Hubert Selby Jr., pouco tempo antes de morrer. Porém, (o auspicioso é pessoal e em nada irónico) Refn tinha apenas 32 anos e o filme valeu-lhe o dissabor da falência – porventura foi daí que veio a grande mossa que o conduziu pela sinuosidade festivaleira das piores colinas de Hollywood. É meter-lhe um chip de potência.