domingo, 16 de novembro de 2008

Combater o destino

«Havia algo acerca do homem e do rosto que eu vira sob a luz trémula das nossas lanternas. Agora de repente tenho a certeza. […] e se aquilo fosse algo de um romance, limitar-se-ia apenas a ser irritante. De facto, tenho lido muito, em especial durante os últimos anos, mas antes também o fazia, e tenho pensado sobre aquilo que li, e esse tipo de coincidência parece demasiado rebuscado na ficção, pelo menos nos romances contemporâneos, e acho que é difícil de aceitar. Pode parecer muito bem em Dickens, mas quando se lê Dickens estamos a ler uma longa balada de um mundo desaparecido, em que tudo tem de se juntar no fim como uma equação, em que o equilíbrio daquilo que foi anteriormente perturbado deve ser restaurado de modo a que os deuses possam sorrir. Talvez uma consolação ou um protesto contra um mundo que saiu dos eixos, mas agora já não é assim, o meu mundo não é assim, e nunca me dei bem com aqueles que acreditam que as nossas vidas são governadas pelo destino. Eles queixam-se, lavam as mãos e infundem piedade. Eu acredito que somos nós que modelamos as nossas vidas, de qualquer maneira, eu modelei a minha, valha o que valer, e assumo toda a responsabilidade. Mas de todos os lugares para onde me poderia ter mudado, tinha de aterrar exactamente aqui.»
Per Petterson, Cavalos Roubados, pp. 73-74.
[Cruz Quebrada: Casa das Letras, 1.ª edição, Outubro de 2008, 275 pp.; tradução de Maria João Freire de Andrade; obra original: Ut og stjæle hester, 2003.]

1 comentário:

Rosa Brava disse...

Pelo apreço que tenho por este blogue, tenho um Prémio para ele, que espero que aceite.

Um abraço,